Relutei mas resolvi visitar um psicólogo. Precisava desvendar, se possível, a bagunça caótica que é minha mente. Mamãe já deveria ter me levado na infância, mas ela nem sabia o que era psicólogo. Consultório bacana, chique mesmo; recepcionista bonita com um bonito coque no cabelo, uniforme impecável, sorriso aberto de dentes brancos, bonitos mesmo.
Olá, seu Eduardo, a doutora Cristiane está à sua espera.
Agradeci e adentrei ao consultório. Sentei-me confortavelmente em uma poltrona confortável. Redundância...já deveria ser efeito da consulta. Depois de um pequeno preâmbulo, doutora Cristiane me pede para fazer um exercício de "Fluxo de Consciência".
Explicou-me que eu deveria escrever tudo o que viesse à minha mente, sem pensar nada, simplesmente vá escrevendo sem pensar, pediu-me. Moleza. Sentei-me na mesa indicada, recebi uma folha de papel e uma caneta Bic que eu quase peço para trocar por uma Compactor (sou muito patriota e a França nos venceu na Copa de 98) e tal qual Chico Xavier incorporando um grande autor da literatura russa, apoiei a cabeça em uma das mãos e deixei meu fluxo jorrar...
flamengo noite floresta do comboio da sofrência romantizada aprendiz de carpinteiro botafogo vasco da gama inflama o prédio todo de janela porta quebrada do jardim borboleta do aquário reformado com cimento na clarabóia azul canto de pesqueiro alto mar navio de guerra marinha dezembro sessenta e sete chuva danada pipoca doce do encantado...
Chega. Muito bem, agora deixe-me ver o que o teu inconsciente me diz...olha, você pensou um pouco para escrever em algum momento não é?
Complicado não pensar e só escrever o que aparecer na cabeça assim, do nada, me desculpei.
Eu sei, mas o exercício é exatamente este. Vamos tentar de novo?
Precisa?
Vamos lá, mas tente não pensar em nada, liberte seus pensamentos e deixem eles voarem para longe tal qual um monge em meditação transcendental do alto de uma montanha nevada do Nepal em uma segunda-feira...por um momento pensei que a própria doutora Cristiane estive em fluxo de consciência.
Que seja.
cardume macarrão picanha montanha neve estrada pedra árvore bicho cachorro gato papagaio arara azul cachoeira pingando carro corvete chiclete de batata feijão azul corrida treino mulher prego ferrugem batata cozida infinito andrômeda cai levanta sobe jumento estrada cabocla lula cartão bolso pato galinha dinossauro sapato pedra dívida cimento parede otário natal coito imbecil detergente açai catavento navio pavio ajudante flexão cabeça nadadeira chupa golpe ostracismo...
Chega. Muito bem. Vejamos...
Ela analisa outra vez meu fluxo (isso soa estranho, meu fluxo). Olha, olha outra vez, faz uma cara que não consegui interpretar se era de pena ou de preocupação e deu o veredito:
é, seu inconsciente é bem complexo e desarrumado.
Ao ouvir tal diagnóstico levanto, digo Mas eu não preciso pagar 150 paus para saber o que eu já sei.
Peço licença, agradeço e saio correndo no vento da rua tristonha carrinho de pipoca doce sinal amarelo canta dança verão aquecimento dívidas não pagas do salário acabado esperando décimo terceiro aquela mulher sorriu para mim.
* * *
Uma consulta interessante.
ResponderExcluirPagou, mas confirmou a desarrumação do seu consciente através do inconsciente. Ou do subconsciente? Já nem tenho a certeza, também preciso de ir a um psicólogo... Mas dê-se por satisfeito, você também pagaria por uma radiografia à perna que saberia partida de antemão...
Uma história divertida, gostei de ler.
Boa semana caro Eduardo.
Um abraço.
Escrever o que vier à mente sem pensar? Mas se veio à mente, e estamos acordados, portanto conscientes, já estamos pensando. Ou não?
ResponderExcluirEntão, Marreta, "sem pensar" é modo de dizer, o tal exercício (que não é invenção minha) é você escrever ou falar o que lhe vem à cabeça sem antes pensar no que vai escrever ou falar. Isso traria à tona conteúdos inconscientes.
ExcluirSe escrevêssemos o que nos vem à mente seria um Deus nos acuda. Tanto nos homens como em nós mulheres. Imagino que tenha sido uma consulta muito interessamnte
ResponderExcluir*
Amor e Paz
*/*
Ilusões e Poesia
*/*
Olá. Mas o intuito é exatamente esse....rs deixa sair, deixa rolar, deixa escapar...ainda bem que existe sigilo profissional entre psicólogo e paciente...
ExcluirBoa noite de Paz, Eduardo!
ResponderExcluirPraticamente eu já faço o tal fluxo sem saber que fazia, kkk... escrevo mesmo.
O que tenho certeza é que vou agora fazer uma pipoca doce para comer após ler seu relato...
Tenha uma nova semana abençoada!
Abraços fraternos
Prefiro salgada...rs
ExcluirOlá!
ResponderExcluirPois é, deixar fluir, mesmo que as palavras te pareça sem sentido.
Boa noite e suave semana.
Una visita interesante
ResponderExcluirTeconfirma lo que ya sabias y encima pagas
....esto es un caos
Buena semana
Muito legal o seu texto (que precisou pensar para escrever). Falando sério, o grande barato hoje para mim é acionar o microfonezinho do zap e falar sem controle, vendo o que foi dito ser transformado em texto escrito. O mais engraçado é descobrir que essa excelente ferramenta também é puritana, pois regista a palavra "puta" como "p***". É mole? Tenho utilizado muito e depois corrijo tudo.
ResponderExcluirkkkkkkkkkkk
ExcluirNunca fui ao psicólogo e acho que precisava.
ResponderExcluirTalvez um dia ganhe coragem.
Na minha juventude não se fala em psicólogos.
Beijinho, Eduardo.😘
Boa tarde de terça-feira meu querido amigo Eduardo. Conversar com psicólogo, faz muito bem.
ResponderExcluirUm arraso, genial, amei! Me senti você escrevendo! Amei o diagnóstico dela porque o meu está feito uma "barata tonta" Sabe como é? Pensando bem, marcarei uma consulta! Rsrsrsr! Abração!
ResponderExcluircreio que, em partes, a terapia é meio isso mesmo: pagar para saber o que a gente já sabe. o problema é que muitas vezes a gente não sabe que a gente sabe e a gente não sabe como saber. no fim é pagar pela tomada de consciência, que, dependendo do caso, não ocorre assim, de graça (risos).
ResponderExcluirótima crônica!
beijinhos
Boa tarde Edu
ResponderExcluirEu nunca fui a um psicólogo, porque acho que eles me dizem o que eu quero ouvir e isso eu já sei.
Gostei da sua crónica, se fosse eu fazia o mesmo.
Mas, eu sorri com o seu escrito.
Semana abençoada com saúde e paz.
Um abraço
:)
Nunca fui a um psicólogo, Eduardo
ResponderExcluirAchei bem interessante a "consulta"
Tomara as próximas te ajudem mais e mais.
Um grande abraço
Verena.
Olá, amigo Edu, sem medo, posso afirmar que essa crônica é das mais criativas que já vi. Uma crônica da melhor qualidade. Meus parabéns!
ResponderExcluirUma boa semana,
um abraço.
Olá, Eduardo
ResponderExcluirEssa consulta tem muito que se lhe diga.
O que eu sei é que me vi retratada nela.
Desarrumação em forma...
Abraço
Olinda
Oi, Edu, li essa crônica junto com o Pedro, rimos muito,
ResponderExcluirquanta criatividade, que loucura!!!
Eu não sei o que faria com essa terapeuta!
Ou sei, mas não digo... tenho de me comportar direitinho, minha mãe
assim me ensinou...
Abraços, essa valeu!
Oi Edu, gostei da ideia do fluxo de pensamento. Não sei se eu daria conta de escrever na velocidade que meu pensamento flui.
ResponderExcluirAté breve;
Helaina (Escritora || Blogueira)
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