sábado, 11 de outubro de 2025

Elevação

 


Milan Kundera escreveu em A Insustentável Leveza do Ser, "que aquele que deseja continuamente 'elevar-se' deve esperar um dia pela vertigem. A vertigem não é o medo de cair, é outra coisa. É a voz do vazio embaixo de nós, que nos atrai e nos envolve, é o desejo da queda do qual nos defendemos aterrorizados". Para alguns, não basta subir a montanha que há próximo de casa, é preciso chegar ao topo do Everest. Admiro tais pessoas mas também tenho pena delas. Elas querem sempre a elevação. Estar no maior topo possível. Olhar o mundo do alto e contemplar seus contornos gozando na alma a satisfação de ter chegado lá. Mas quando se chega lá não há mais para onde ir. O topo é o limite da caminhada pra cima. E diante da ausência da continuidade, o que vem é a vertigem. Talvez eu diga isso porque em qualquer caminhada minha para o alto, nunca ambicionei chagar ao topo. Estabelecer-me no meio da coisa para mim já era satisfatório. Acredito que a energia que você gasta para chegar ao topo, seria melhor aproveitada se você a gastasse ali mesmo, no meio. É como o conquistador Alexandre, o Grande, da Macedônia. Ele elevou seu império até onde poderia ir. Conquistou o império persa, o Egito, a Palestina, chegou até à Índia. E então ele viu que não tinha mais nada para conquistar, sentou e chorou.


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23 comentários:

  1. Concorso que podemos esperar chegar a um bom lugar, mas não fazer disso bandeira de vida. Aproveitar o caminho, a subida e até eventuais descidas! Adorei! abraços praianos, chica

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  2. Este comentário foi removido pelo autor.

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  3. Boa noite Eduardo!

    Que texto potente e de uma lucidez quase melancólica. Eduardo, aqui se toca num ponto que poucos têm coragem de admitir: a vertigem não nasce do fracasso, mas do sucesso absoluto, daquele instante em que não há mais o que subir. O vazio, então, nos chama. Concordo que há uma sabedoria silenciosa em “ficar no meio”. O meio é o lugar do ar, da respiração, da observação. O topo é bonito, sim, mas é também solitário, sem vento, sem, sem barulho. No meio, há vida, movimento e continuidade.
    Talvez a verdadeira elevação não seja a de quem chega ao cume, mas a de quem encontra sentido no caminho e aprende a amar o chão onde os pés ainda tocam.

    PS: precisei intensificar por isso exclui o oitro comentário.
    Um abraço amigo
    Fernanda

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    1. é verdade, do topo a vista é bem bonita, mas muitas vezes o quanto você deixou de viver realmente apenas para chegar ao topo e aí? Talvez isso cai bem com os atletas de alto rendimento. Eles de fato, precisam tentar chegar ao topo. Ou ao topo onde eles podem chegar. Ninguém dá crédito a quem ficou em quinto ou quarto lugar. Nem mesmo o terceiro ou o vice são lembrados...Mas há situações outras que o esforço pra chegar ao topo não compensa o remédio pra ansiedade, muitas vezes a perda da família, a falta de tempo para os filhos...

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  4. Acho que sou bem parecida com você nesse aspecto. Chega num ponto, o meio, que me sinto bem e dali não tenho desejo de sair. Quero trazer mais pessoas para onde estou, para que todas sintam o mesmo conforto, quanto ao topo, posso observá-lo, sem necessariamente desejá-lo.

    Tenha uma boa semana!

    Helaina (Escritora || Blogueira)
    https://hipercriativa.blogspot.com (Livros, filmes e séries)
    https://universo-invisivel.blogspot.com (Contos, crônicas e afins)

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  5. Bom dia Edu,
    Uma excelente Crónica!
    Há um ditado que diz "quanto maior a subida, maior a queda".
    Fico-me também pelo meio, onde penso ter mais establidade física e emocional.

    As fotos do meu blogue sou eu que tiro, sim, com o meu telemóvel. Muito o brigada por ter apreciado.
    Um beijinho e bom domingo.
    Emília

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  6. Oi, Eduardo! De maneira geral, os indivíduos que afirmam não almejar a ascensão ao ápice de suas potencialidades estão, em verdade, enganando-se a si mesmos. O ser humano, por sua própria essência, é dotado de uma ambição intrínseca; enquanto não alcançarem a cúpula de suas aspirações, não se contentam com o caminho intermediário. Essa característica é especialmente evidente entre os atletas de alto rendimento, embora não se restrinja a eles, sendo uma propriedade que permeia a grande maioria da humanidade. A ânsia e o ímpeto de atingir o cume impulsionam-nos em nossa jornada. Não vislumbro qualquer impropriedade nessa busca, pois todos nós, sem exceção, deveríamos aspirar ao topo até que a sensação de realização nos envolvesse. Contudo, é inegável que uma considerável fração da população enfrenta dificuldades em lograr tal proeza, especialmente em um contexto como o brasileiro, onde a parcela mais carente e desfavorecida sequer tem acesso ao básico, o que torna ainda mais árdua a conquista do ápice. No que tange à vertigem, esta é provocada pela mente, gerando um desconforto, muitas vezes extremo, como uma forma de proteção contra um risco real. Abraço!

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    1. Oi, Luciano. Creio que a provocação do Kundera (nem a minha) é no sentido de limitar a evolução das potencialidades humanas. A questão é o que fazer quando essas potencialidades chegam ao ápice, ao topo. É preciso estar preparado para o ar rarefeito. É preciso estar preparado com a disputa lá no topo. É preciso questionar o modo de se ver quem está tentando chegar lá e não consegue. Porque os humanos não são iguais. Minhas potencialidades não são as suas, ninguém possui exatamente as mesmas potencialidades. Não vejo como fraqueza alguém que tem a potencialidade de chegar ao topo, mas chega em um lugar alto(mas não no topo) e ali coloca seu descanso. É uma questão existencial. Qual preço você está disposto a pagar para ficar no topo? E ainda assim, não há nenhuma certeza que lá se permanecerá.
      valeu, abraços

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    2. Oi, Eduardo! De modo geral, são raras as pessoas que se preocupam com o que farão ao atingir o ápice; a grande maioria anseia tão somente por alcançar tal cume, inclusive muitas o fazem mediante caminhos de índole controversa. Certamente, cada indivíduo é diferente, e aquilo que para mim figura como a mais profunda fraqueza pode, para outrem, representar a mais excelsa virtude, e vice-versa. Tal fenômeno é comum a todos nós. No meu íntimo, recuso-me a arcar com qualquer custo para atingir o cume, pois não o conquistei e, sendo perfeitamente sincero, nem mesmo sei se tal ascensão me é desejada. Contudo, se porventura eu lá chegar, jamais retornarei à superfície, disso tenho convicção. Abraço!

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  7. Penso como você. O Cazuza e Lobão cantaram que é melhor viver dez anos a mil que mil anos a dez. Eu prefiro pensar que o ideal seria viver cem anos a cem (o produto é o mesmo).

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  8. Uma crônica com dizeres muito profundos Edu!
    Obrigada por trazer temas que nos colocam para refletir.
    Alexandre, o Grande, tinha uma ambição sem limites em conquistar tudo. Mas há um limite para tanto. E a que custo ele construiu o seu gigantesco império, subjugando as nações...
    No nosso caso seria construir úlceras doloridas no estômago em razão da ansiedade crescente. Não vale a pena chegar tão alto e a que custo...
    Abraços querido amigo!!

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  9. Tem ocasiões que ficar no meio "é preciso", mas querer ir ao topo faz parte.
    Não que para isso, se use caminhos tortuosos demais. Penso assim.
    Subir o Everest, por exemplo, para mim é exibicionismo puro. Tô fora até de assistir.
    Caminhos tortuosos demais não é para mim.

    Meu Kindle é mais antigo que o seu. O defeito do meu é que não grifa.
    E grifar é preciso.
    Abraço.

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  10. Adorei ler a sua reflexiva e excelente crônica, Edu.
    Não sejamos apressados, Devemos aproveitar a riqueza do momento.
    Um grande abraço
    Verena




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  11. Edu,
    Sua publicação me lembra que tenho esse
    livro aqui em casa e não li. Vou separar e
    ler, mas não esse ano.
    Valeu a análise que me serve de dica.
    E me lembrou que me filho
    presenciou um grande artista
    e músico, que sonhou em conhecer
    uma lenda da música traçou muitos
    planos para conhecer o ídolo, foi
    até para o exterior e não conseguiu
    conhece-lo pessoalmente. Voltou pro Brasil,
    seguiu sua carreira, fez fama com sua Banda
    e um dia, recebeu o convite para com sua Banda abrir
    o Show de seu ídolo no RJ, no Circo Voador.
    Foi, abraço seu ídlo, realizou seu sonho.
    Meu filho que era da Banda dele, após o show
    o viu desolado no camarim. Meu filho perguntou
    a causa e ele disse: -Realizei meu sonho, e agora?
    E diz meu filho que ele chorou. Meu filho que é
    prático disse pra ele: -Agora Cara é hora de sonhar
    outros sonhos. Se não conseguir sonhar outros
    sonhos, arruma um amor, casa e vai ter seu filhos
    e se prepara pra sonhar juntos com eles".
    Sua matéria sobre o livro , me lembrou essa historia.
    Bjins
    CatiahôAlc.

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  12. É no meio que está a virtude...
    Mas há quem esteja sempre à procura de topos. Lembro-me do Cristiano Ronaldo, por exemplo, que procura o topo dos 1.000 golos... mas faltam cerca de 50 ele já tem 40 anos.
    Boa semana.
    Um abraço.

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  13. Também li há muito tempo "A insustentável leveza do ser". Gostei dez ler o seu texto. E lembrei Miguel Torga: "Só quem sobe à montanha toca o céu" Mesmo que seja interiormente e com vertigens.
    Uma boa semana. meu Amigo Eduardo.
    Um beijo.

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  14. Belíssimo texto e reflexão.

    Boa semana!

    O JOVEM JORNALISTA está no ar cheio de posts novos e novidades! Não deixe de conferir!

    Jovem Jornalista
    Instagram

    Até mais, Emerson Garcia

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  15. Acredite ou não essa reflexão fez muito sentido para mim! Obrigada!

    A tua opinião é muito importante, por isso gostava de pedir 3 minutos do teu tempo, para responderes ao questionário de consulta e satisfação sobre o meu blog. É muito simples, bsta clicares aqui.
    Obrigada!

    Bjxxx,
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  16. Tenho na minha estante Milan Kundera _ seu texto instiga nova leitura , ele aborda a leveza e o peso ,ou seja a responsabilidade e a liberdade. É bem reflexivo seu texto. Geralmente ,quando temos um alvo almejamos alcança-lo na totalidade. Ficar no meio nunca satisfaz . Kundera é tcheco e lembrei que escreveu o livro em Praga . Estive em Praga , Edu _ belíssima cidade da Chéquia _ recomendo conhecer a cidade das cem cúpulas, vai gostar muito .
    Um abraço e boa semana. Dei um recuo mas já estou voltando aos costumes.

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  17. Olá, Eduardo
    Cita Milan Kundera e Alexandre, o Grande, neste seu texto o que nos leva
    a recordar e a reflectir sobre a ânsia de chegar ao topo e das vertigens
    que isso nos pode causar. Há pessoas cuja ambição não tem limites.
    As campanhas de Alexandre, o Grande, que morreu aos 32 anos, eram tão
    frequentes que só de ler a vida dele nos dá vertigens.
    Há um certo ponto que, se tivermos um certo equilíbrio, convém não
    ultrapassar.
    Abraço
    Olinda

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  18. Excelente crónica.
    Para os atletas sim, faz sentido ter como objetivo chegar ao topo, pois só os que lá chegam são homenageados. Mas pessoalmente acredito, que "no meio é que está a virtude" como diz o ditado popular. O importante é aproveitar ao máximo cada etapa da nossa caminhada.
    Abraços

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Se não gostou, perdoe-me a falta de talento "escriturístico..."